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CDU Valongo

Página informativa sobre a atividade da CDU no concelho de Valongo.

Os incêndios florestais e a situação da floresta portuguesa

04.08.10

1 - Na continuidade de 2009, em que arderam 87 mil hectares, o balanço dos últimos 15 dias de Julho, veio demonstrar, mais uma vez, que os problemas estruturais da floresta portuguesa estão longe de estar resolvidos. Como o PCP tem denunciado.

Quando os principais responsáveis pelo Plano Nacional Defesa Floresta Contra Incêndios, Ministro e Secretário de Estado da Administração Interna, perante o crescer do número de ocorrências e área ardida, da dimensão e duração de alguns dos incêndios florestais, voltam a invocar as condições meteorológicas adversas – calor e humidade – e os incendiários, para justificar a situação, estamos perante a fuga a assumir a responsabilidade política pela causa essencial e central dos incêndios florestais: o estado da floresta portuguesa. A que se deve juntar algumas “poupanças” por conta do Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), como acontece com as carências de meios nas Áreas Protegidas!
Esquecendo-se os mesmos governantes, que ainda “ontem”, em 2007 e 2008, anos de baixo índice de severidade diário (medida do risco de ocorrência de um incêndio tendo em conta as condições meteorológicas), atribuíam às medidas do Governo o sucesso de anos com reduzidos incêndios florestais e área ardida.

Estas constatações não põem em causa as melhorias verificadas no dispositivo de combate. Bem pelo contrário, elas demonstram que depois de um longo período de incúria e subestimação pela política de direita de sucessivos governos (PS, PSD e CDS), responsáveis por mais de 2,7 milhões de hectares de floresta queimada nos últimos 25 anos, depois dos anos calamitosos de 2003 e 2005, foi possível, como o PCP sempre afirmou e propôs, travar o flagelo.
E que tal aconteceria com investimento público adequado em meios e recursos humanos, com outra organização do dispositivo de combate e a convocação e o envolvimento de todas as entidades e agentes mais directamente interessadas e preocupadas com o problema dos incêndios florestais – produtores florestais e compartes dos baldios e as suas associações, corpos de bombeiros, municípios, departamentos de instituições universitárias.

Como sempre afirmamos, era possível caminhar para respostas necessárias a um combate eficiente, reduzindo substancialmente a dimensão e o número de fogos, os prejuízos e os riscos de acidentes pessoais. Mas como sempre alertámos, o cerne do problema era e é o estado da floresta e das matas portuguesas.

2 - Ora, as questões estruturais da floresta, o seu ordenamento e gestão activa, e a chamada prevenção estrutural, não passaram do papel! Se dúvidas há sobre esta afirmação, é fácil comprová-la. Basta fazer o balanço de concretização da “matriz de responsabilidades e indicadores de implementação da Estratégia Nacional para as Florestas (ENF)”! Estratégia, aprovada pelo Governo, em Resolução do Conselho de Ministros de 15 de Setembro de 2006, após os desastres de 2003 e 2005.

Confluindo com políticas agro-rurais (e não só), que agravaram o abandono da agricultura e a desertificação humana e económica de muitas regiões, as políticas agro-florestais, pese as boas intenções afirmadas, patinaram, sem vencer estrangulamentos e défices causados pelas políticas dos últimos 30 anos. Nesse impasse, pesa como questão decisiva as consequências directas e indirectas da contenção orçamental, determinada pelo PEC.

O forte e cego condicionamento financeiro, reduziu e estilhaçou os serviços do Estado para a Floresta (sistema de mobilidade especial, reconfiguração da Direcção Geral dos Recursos Florestais na Autoridade Florestal Nacional), atingiu drasticamente o investimento na floresta e o avanço no ordenamento florestal. Processo que acaba por frustrar a enorme disponibilidade, empenhamento e até entusiasmo de produtores e técnicos florestais, compartes dos baldios e o grande envolvimento das suas associações!

São exemplos flagrantes a total ausência de investimentos PRODER na floresta. Se o quadro geral desse Programa é de um enorme atraso, a situação na floresta é um desastre: nem um projecto aprovado nem um contratualizado! A situação com o Fundo Florestal Permanente (30 milhões de euros/ano) não é melhor. A maior parte das suas dotações tem sido “desviada” de uma aplicação directa na floresta, a favor do suporte de serviços e actividades florestais dos municípios e administração central, a par de um crónico atraso no pagamento de investimentos realizados (projectos de 2008)!

Relativamente às Zonas de Intervenção Florestal (ZIF), o Governo vai enchendo a boca com a área florestal já formalmente abrangida (500/600 mil hectares), mas é incapaz de informar quantas já têm uma intervenção real no ordenamento e gestão florestal activa! E fundamentalmente, não tomou as medidas de apoio necessárias ao seu desenvolvimento no terreno.

Em matéria de Cadastro Florestal, instrumento imprescindível à concretização de qualquer política florestal, o Governo anunciou um Projecto-piloto, envolvendo 7 concelhos e um investimento de 15 milhões de euros. A ENF previa que o Cadastro Florestal das áreas baldias e das áreas integradas em ZIF estivesse realizado até final de 2009, e concluído em 2013! Ou seja, investimentos de centenas de milhões de euros!

Sem falar do mercado da madeira e dos seus preços ruinosos, nada incentivadores de qualquer efectiva produção florestal, sob o domínio monopolista de alguma grandes empresas, particularmente no sector do eucalipto/pasta de papel, onde o Governo ou a Autoridade da Concorrência, continuam sem qualquer intervenção. O preço da pasta de papel evoluiu entre 2008 e 2010 de 580€/tonelada(t) para 700€/t enquanto a matéria-prima/eucalipto descia dos 45€/t para os 39€/t!

3 - Mas mesmo no quadro do dispositivo de prevenção e combate aos incêndios florestais se notam as consequências das restrições orçamentais, mesmo se aparentemente, não têm criado problemas na eficiência do Dispositivo de Combate aos Incêndios Florestais. Alguns exemplos são bem ilustrativos desses constrangimentos.

O GAUF, Grupo de Análise e Uso do Fogo, criado em 2006, e visando introduzir um maior grau de tecnicidade e conhecimento na estratégia de combate aos fogos florestais, tem vivido uma permanente instabilidade contratual com o Estado. Grupo de técnicos credenciados no uso e comportamento do fogo, passaram de um regime de recibos verdes no seio da DGRF a uma situação de empresa de serviços contratada pela AFN/ANPC em 2009. Ainda a 15 de Junho, desconheciam o seu futuro no DECIF 2010, acabando por ser contratados até 17 de Novembro!

Nas Áreas Protegidas, as carências em meios e recursos humanos permanecem, nomeadamente vigilantes da natureza e viaturas de 1ª intervenção. Uma expressiva manifestação desse quadro, é a informação do Secretário de Estado do Ambiente, já em plena Fase Bravo que tinham sido abertos concurso para a contratação de mais vigilantes e tinham sido apresentadas candidaturas ao QREN para a aquisição de viaturas!

Nos sectores sob tutela do MAI, avulta o atraso no reequipamento em viaturas de combate dos Bombeiros (cerca de 2000 a necessitar de substituição), e das prometidas 95 novas viaturas em 2007, muitas continuam por entregar! Mas o caso mais paradigmático é sem dúvida, o das comunicações. Desde sempre assinalado com um elemento crucial do Dispositivo, o se verifica, é que passados vários anos sobre os acontecimentos de 2003 e 2005, os Corpos de Bombeiros e os Serviços Municipais de Protecção Civil, continuam fora do SIRESP!

O PCP, sem descurar a necessidade de reforçar e satisfazer as carências do Dispositivo Nacional de Combate aos Incêndios Florestais, dando particular atenção aos problemas das Corporações de Bombeiros Voluntários, vai na sua acção política geral e intervenção institucional, continuar a privilegiar a luta e propostas que respondam aos problemas estruturais da floresta portuguesa. Onde é elemento central outra política agrícola.